Texto publicado na revista BEM VIVER, nº 9, publicação quadrimestral da Construtora
Pereira Alvim de Ribeirão Preto.
Uma velha e sempre
providencial história.
Um estava na esquina,
encostado à parede. Encolhido e quieto, sem nada para ser notado. Era Um comum.
O Outro andava pela calçada. Vinha em paz. Com uma moeda na mão, buscava alguém
que a merecesse: sua boa ação daquele dia. Com ela, Outro sabia que qualquer
Um, poderia ter alimento, teto, boa saúde, crescer, tornar-se letrado,
enfim... usufruir do melhor das coisas. Quando Outro viu Um, parou radiante e
estendeu-lhe a moeda. Perfeito! Completava sua benemerência. Entronizava-se nos
benefícios dos céus!
Um agradeceu a
generosidade, mas não estendeu a mão para a moeda. Não aceitava a oferta. “Não?!” O Outro estranhou: “um miserável não aceitar!?” Talvez
ruídos na comunicação... e insistiu na oferta. Um disse que se o Outro quisesse
dar-lhe alguma coisa, que lhe desse ouvidos por sete minutos: “apenas sete! só sete!” Desse, e Um
estaria recompensado. Teria recebido o donativo. “Está bem!” O outro concordava. “Mas...
porque sete?”
Com paciencia secular, principiou falando dos sete... pecados capitais! E falou
muito sobre eles! Bastante mesmo! Depois
disse das sete idades do homem, dos sete planos da evolução, das sete virtudes
humanas. “O sete – enfatizava – traz a idéia de
totalidade, do completo!”
Argumentando acerca do sete na história, astronomia, teosofia, esoterismo,
filosofia, física, e outros conhecimentos,
Um passeava por todas as
ciências, crendices e sabedoria popular, tirando o véu do
número da perfeição. Assim, as sete rondas planetárias e as sete raças-raiz
foram sendo vislumbradas, da mesma forma que os sete elementais, as sete
divindades que regem a natureza. O significado do sete ia sendo disseminado ao vento...
Estacionados em pé, ali na calçada, Um e Outro permaneceram dias e dias numa
interminável interlocução. Um delírio,
navegando entre o céu e o centro da terra, com gostoso gosto de mel. Depois de
quase terem penetrados no insondável, Um perguntou ao
Outro: “tenho agora os sete minutos de
sua atenção?” O Outro disse sim apenas com o cintilar dos olhos. Então Um
falou: “para ser grande, sê inteiro. Nada teu
exagera ou exclui. Sê todo em cada coisa. Põe quanto és no mínimo que fazes.
Assim como em cada lago, a lua toda brilha, porque alta vive.” Dito isso, arrematou:
“menor que meu
sonho, não posso ser”, um micro poema de seu amigo poeta.
Cravados sete minutos, sem necessidade de conferir o relógio, Um não abriu mais
a boca, porque nada mais precisava ser dito. Acenou grato pelo tempo
concedido, e assim foi se despedindo do
Outro. Atravessou a rua, procurou o melhor jeito de ficar exposto ao sol e
pôs-se a espera.
Ainda com coisas
intrincadas mexendo por dentro, o Outro que tentava compreender melhor aquele
encontro, viu que não demorou nada para Outra pessoa – agora com duas moedas,
uma em cada mão – surgisse e se dirigisse ao Um. A Outra aproximou-se de Um, e... o mesmo ritual!
O Outro,
repentinamente sobressaltado, abandonou o caminho que deveria ir em frente e
deu meia volta. Correu o mais rápido que pode para chegar em casa. Agia como
alguém que não poderia perder mais tempo. Vasculhou por todos os cantos até
encontrar o “empoeirado” Fernando Pessoa. E logo que pegou o poeta, mergulhou
no próprio. Não demorou muito gritou agoniado, como se tivesse em transe: “EU! DEVORANDO POESIA!?”
Pensou que estivesse
doente, delirando. Mas não estava não. É que Um tinha engravidado Outro.
Pressentindo isso, voltou aos poemas.
Marco este texto é seu ou do Lindolf Bell? Ou a epígrafe é de um poema de Bell? Ou esta frase é de Fernando Pessoa? Poderia esclarecer?
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